A DISCRICIONARIEDADE DO GESTOR NO QUE CONCERNE A EXIGÊNCIA DO EIA/RIMA: CONSIDERAÇÕES SOBRE A NATUREZA POLÍTICA DOS ATOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (PARTE 6/6)


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6 A DISCRICIONARIEDADE DO GESTOR NO QUE CONCERNE A EXIGÊNCIA DO EIA/RIMA
Em um processo de licenciamento ambiental, como dito anteriormente, a exigência do Estudo de Impacto Ambiental comumente se dá por pressuposto legal. Portanto, há uma plêiade de atividades e empreendimentos que, de acordo com sua natureza, porte e potencial poluidor, serão não apenas enquadrados como passíveis deste tipo de licenciamento, mas também que, em seu rito processual, terá que se exigir, por obrigatoriedade, a realização do EIA/RIMA.

Ao discorrer sobre o direito que todos temos de usufruir do “meio ambiente ecologicamente equilibrado”, a Constituição Federal de 1988 aponta que

[…] para assegurar a efetividade desse direito, incube ao poder público […] exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental (BRASIL, 988, art. 225, §1º, IV).


Para Paulo Afonso Leme Machado (2020, p. 179), a Constituição empregou o termo “exigir” como uma faculdade não sujeita à discricionariedade da Administração. Ou seja, quando a lei determina a realização do Estudo de Impacto Ambiental, cabe ao Gestor, obrigatoriamente, a cobrança do mesmo.

Mas seria possível interpretar o pensamento de Machado como uma afirmação de que, nos casos em que a lei não obriga tal estudo, a discricionariedade então é cabível? Parece que sim, pois o mesmo sinaliza a possibilidade de realização do EIA em situações que se configuram peculiares, independente da exigência legal:

É preciso utilizar, desde o início, uma metodologia que possibilite aprofundado exame da natureza do impacto e um sistema de ampla participação do público, para que não se escondam os aspectos que possam vir a degradar o meio ambiente. O dano potencial não vem carimbado com traços gritantes, demandando análise meticulosa para identificá-lo, indicar suas consequências e apontar, sem subterfúgios, os meios de impedir ou reduzir o prejuízo ambiental. Na dúvida, emprega-se o princípio da precaução e deve-se escolher a metodologia que a Constituição Federal previu: o Estudo Prévio de Impacto Ambiental (MACHADO, 2020, p. 323).


Outro parecer que podemos mencionar, neste sentido, é o da desembargadora federal Vivian Josete Panteão Caminha, da 4ª turma do TRF-4. Ao julgar uma Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público Federal acerca de irregularidades cometidas no processo de licenciamento ambiental da construção de um campus da Universidade Federal de Santa Catarina, a magistrada expôs na sua sentença o seguinte entendimento:

A escolha do estudo a ser realizado é ato discricionário da instituição condutora do procedimento de licenciamento e deve ser feita com base em critérios técnicos relacionados ao porte do empreendimento e ao potencial indutor de impactos ambientais que apresenta.


Herman Benjamin (1992 apud HASEMANN, 2010) aponta que a discricionariedade do Administrador no que diz respeito a exigência do EIA/RIMA, apenas não caberia para os casos em que os impactos causados por determinada atividade ou empreendimento forem considerados insignificantes. No mais, para todas as hipóteses não previstas no rol do artigo 2º da Resolução nº 01/86 (artigo esse que lista as atividades em que o EIA é obrigatório) restaria certa margem de discricionariedade na apreciação do órgão competente. Benjamin completa, afirmando:

No Brasil, há duas maneiras de avaliação da significância do impacto. Uma, ope legis, cria uma presunção absoluta de necessidade. É o caso das hipóteses do art. 2.°, da Resolução nº 001/86. Trata-se de vinculação total do administrador. A outra maneira, por não ter previsão legal expressa, deixa muito da avaliação à esfera discricionária do administrador.


Milaré (2007 apud HASEMANN, 2010) segue o entendimento de Benjamin sobre a insignificância do impacto ambiental:

[...] é possível concluir que o órgão de controle mantém certa dose de liberdade para avaliar dito pressuposto do EIA/RIMA, isto é, o significativo impacto ambiental. Evidenciada, porém, por regular prova técnica, a insignificância do impacto, torna-se inviável a exigência do estudo.


Por tudo que foi dito até aqui, podemos dizer que a discricionariedade do Administrador para exigir o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) não caberia, de fato, nas situações em que a lei obrigar tal Estudo. E também quando o impacto for considerado insignificante. Para os demais casos, há margem para juízo de valor, conveniência e oportunidade, entre outros, como elementos para tomada de decisão.

Afinal, quando falamos do patrimônio ambiental, estamos tratando da vida e da perenidade da espécie humana neste planeta e isso possui, de forma intrínseca, uma implicação ética, uma consideração subjetiva.


CONCLUSÃO
Procuramos, com este trabalho, lançar luz sobre a relação entre a discricionariedade da Administração Pública e a política, com destaque para os casos em que a exigência do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) se faz opcional.

Acreditamos que o presente trabalho tenha dado conta de demonstrar que mesmo uma decisão tecnicamente correta, tomada pelo Gestor Público em determinada situação, trás em seu bojo uma motivação fundamentalmente política. Em outras palavras, o Gestor opta pela solução tecnicamente mais adequada, visando as consequências políticas dessa decisão.

Dar o devido combate, no campo democrático, a um modelo de desenvolvimento que não se alinhe ao clamor mundial por justiça climática, talvez seja algo que não abarque mais e apenas, ações de conscientização sobre a crise ambiental, visto que a necessidade de proteção do patrimônio natural já é um consenso humanitário. Precisamos pensar outros caminhos, que talvez passem pelo fortalecimento da democracia participativa, exatamente para que a democracia representativa possa dar à sociedade as respostas que ela (a democracia representativa) precisa dar.

Por fim, promover uma investigação aprofundada sobre a relação entre discricionariedade administrativa e a política, de fato é algo que extrapola o objetivo do presente ensaio, que apenas convida a essa reflexão. Mas esperamos poder ter apresentado elementos teóricos capazes de contribuir para o aprimoramento da cidadania e da luta ambiental.

 

 

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