NOTAS SOBRE O CAPITALISMO 4.0 E A DÍVIDA PÚBLICA BRASILEIRA (PARTE 3/5)

 
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Texto sobre economia, escrito por um não-economista, mas que mesmo assim pode valer a pena ser lido.

 

Em live realizada no dia 14 de dezembro de 2022, o professor Ladislau Dowbor fez interessantes considerações acerca da problemática dos juros altos no Brasil e da nossa dívida pública. Transcrevo abaixo os principais pontos.
 
82% da nossa dívida pública, em 2023 algo em torno de 6 trilhões de reais, advém do serviço da dívida, ou seja, do pagamento de juros sobre juros, muitas vezes contabilizados como amortizações, a bancos e investidores privados.

Os bancos compram títulos do governo, sob o dinheiro que está nas poupanças (sobra de caixa), com rendimento de 13,75%. No resto do mundo é em torno de 1%. O dinheiro que sai do governo para esses grupos financeiros, para o pagamento do serviço da dívida, advém dos impostos. Então somos duplamente roubados: o dinheiro que o governo transfere para os bancos é nosso (impostos) e o dinheiro que os bancos usam para comprar títulos da dívida também é nosso (depósitos). Em suma, há um sistema montado de DRENO dos recursos públicos.
 
Neste ponto se faz necessário entender a diferença entre dívida e investimento. 
 
O investimento, quando público, pode ser viabilizado pelo aumento da dívida, pela conversão de reservas cambiais ou pela emissão de moeda. O importante não é de onde vem o dinheiro, mas para onde ele vai. Em outras palavras, o problema central não é a dívida, mas como ela é gerada.

Mas só é possível controlar inflação com aumento de juros? 
 
Os liberais, adeptos da Teoria Quantitativa da Moeda - TQM (também chamada por André Lara Resende de "camisa de força ideológica") dizem que sim. Para eles, MV=PY; onde M é a quantidade de moeda; V é a velocidade de circulação da mesma; P representa os preços e; Y é o nível de atividade econômica. Então, por esta teoria, "o aumento da moeda implica no aumento de preços se a velocidade de circulação das mercadorias e o nível de atividade econômica forem constantes".

Para o professor Dowbor (que segue outra linha), por conta da TQM, estamos no nono ano de economia estagnada, onde 70% do estoque de títulos da dívida pública está nas mãos de grupos financeiros; onde a inflação vem crescendo por conta do sub abastecimento do mercado; onde a venda do nosso petróleo acontece com base no preço internacional. Ele aponta ainda sérios problemas de arrecadação, expresso, por exemplo, na forma da Lei Kandir, que prevê a isenção do pagamento de ICMS sobre as exportações de produtos primários (itens agrícolas, semielaborados ou serviços).
 
A inflação é uma forma dos grandes grupos financeiros se apropriarem dos recursos do estado. Representa um dos drenos citados anteriormente aqui. E para piorar, não temos mais estoque regulador por conta da falta de investimento em infraestrutura de silos de alimentos. Sem contar o fato do teto de gastos, no governo Bolsonaro, ter sido rompido em 800 bilhões e não necessariamente em função do investimento social.

É como se a nossa política fiscal estivesse literalmente de cabeça para baixo, pois é sabido que o dinheiro investido no consumo das famílias retorna para o estado. Neste caso, a cada 1 real investido, o PIB aumenta em 1,75 reais. E isso para não falar dos impactos gerados na pequena empresa, que tem que ter para quem vender (e não consegue) e precisa de crédito barato para investir na produção (e não tem acesso). O neoliberalismo, portanto, é sinônimo de redução da capacidade de ação do estado, privatizações e juros altos.

O brasileiro tem trauma de inflação. Então a retórica do sistema financeiro, de que qualquer investimento na sociedade e redução da taxa de juros vai gerar inflação, acaba tendo muito força. Força essa que é diariamente vitaminada pelos editoriais da imprensa liberal, subservientes à Faria Lima.

O nosso PIB só tem "aumentado", nas últimas amostragens, porque se contabiliza exportação de petróleo bruto; exportação de ferro e níquel; exportação commodities e lucros financeiros. Como vimos no artigo anterior, o setor de exportação não é o mais importante para o Brasil. Representa aproximadamente 10% do PIB. O resto é mercado interno.

 
QUE RUMO SEGUIR?
 
Há estudos prontos hoje dando conta que 149 programas de inclusão social não gerariam inflação e promoveriam crescimento econômico. E também outros, que apontam os benefícios de toda cidade ter um cinturão verde hortifrutigranjeiro, que geraria o mesmo efeito. A especulação imobiliária também precisa ser combatida, pois a mesma está mais situada no campo do rentismo do que do capitalismo propriamente dito. Em suma, o que está funcionando hoje no Brasil é a agiotagem financeira e a exportação de bens primários.
 
O Banco Central (BC) não é autônomo, ele está nas mãos dos banqueiros. Elites financeiras estão travando o desenvolvimento do país. E a imaterialidade (algorítmos, virtualização, digitalização, plataformização da economia) ajudou o capitalismo a se transformar em capitalismo financeiro. 
 
Por tudo isso faz necessário resgatar a função social da economia.
 
 
REFERÊNCIA

FILÓSOFO PAULO GHIRALDELLI. Live com o Professor Ladislau Dowbor [...] Youtube, 14 dez. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=kK5MoVBrT2s>. Acesso em: 30 jan. 2023.