A BACIA HIDROGRÁFICA ENQUANTO SISTEMA SOCIAL, ECONÔMICO E AMBIENTAL (PARTE 1/2)

Neste post, vamos dar início a uma série de propostas de discussão sobre a gestão das águas, a partir de informações sobre a unidade territorial que define as políticas públicas deste setor, qual seja, a bacia hidrográfica.

De acordo com a Agência Nacional de Águas, ANA (2011),

[...] bacia hidrográfica é a região compreendida por um território e por diversos cursos d’água. Da chuva que cai no interior da bacia, parte escoa pela superfície e parte infiltra no solo. A água superficial escoa até um curso d’água (rio principal) ou um sistema conectado de cursos d’água afluentes; essas águas, normalmente, são descarregadas por meio de uma única foz (ou exutório) localizada no ponto mais baixo da região. Da parte infiltrada, uma parcela escoa para os leitos dos rios, outra parcela é evaporada por meio da transpiração da vegetação e outra é armazenada no subsolo compondo os aquíferos subterrâneos.

A partir do estudo da bacia hidrográfica enquanto base de análise, obtém-se os indicadores que irão determinar a qualidade ambiental do espaço e as consequências da ação humana.

Devido a sua importância e diversidade de usos, muitos também são os interesses em relação à água. Mas a distribuição desigual e a utilização inadequada terminam por levar pessoas e grupos a conflitos, que contribuem com a insegurança da garantia desse recurso para as gerações presentes e futuras. Portanto, estabelecer acordos entre os múltiplos usos requer institucionalizações que permitam a conciliação dos diferentes interesses (ANA, 2011).

Nesse contexto, a promulgação da Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei Federal nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997), também conhecida como “Lei das Águas”, figurou como arranjo institucional que possibilitou maior participação de setores da sociedade envolvidos na gestão de recursos hídricos.  Tal política inova por aventar a gestão hídrica num formato descentralizado, cuja unidade é a própria bacia hidrográfica, contando com a participação dos poderes públicos, dos usuários e das organizações da sociedade civil, através dos Comitês de Bacias Hidrográficas (ANA, 2011).

Por “usos múltiplos das águas” distingue-se, entre outros: abastecimento urbano, irrigação agrícola, uso industrial, geração de energia elétrica, manutenção da vida dos ecossistemas e despejo de efluentes. Podemos destacar esse olhar variado para a água da seguinte forma:

A visão dos que desempenham atividades ligadas ao lazer e ao turismo [...] se esta corresponde aos anseios de seus visitantes ou se a água é própria para o banho; para empresa de saneamento, o interesse volta-se tanto à qualidade quanto à quantidade de água para distribuição à população; as empresas responsáveis pela navegação estão preocupadas com as condições da via navegável – nível de água e condições da calha do rio; os pescadores importam-se se o rio tem possibilidade de manter as espécies de peixes e em quantidade adequada para pesca (ANA, 2011).

Portanto, cada segmento defende seus próprios interesses. Tais conflitos, ainda hoje, muitas vezes são tratados em espaços fechados, com base apenas em diretrizes governamentais. Isso reforça a necessidade de se dirimir essas questões em ambiente público e transparente, com a participação de todos os atores direta ou indiretamente envolvidos. Tal ambiente é o CBH - Comitê de Bacia Hidrográfica.

No que diz respeito à composição do CBH, a Lei nº 9.433, de 08 de janeiro de 1997, em seus artigos 38, 39 e 47 explicam a composição e as responsabilidades dos Comitês de Bacia, no âmbito de sua área de atuação:

Art. 38. II - arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados aos recursos hídricos;
Art. 39. Os Comitês de Bacia Hidrográfica são compostos por representantes:
I - da União;
II - dos Estados e do Distrito Federal cujos territórios se situem, ainda que parcialmente, em suas respectivas áreas de atuação;
III - dos Municípios situados, no todo ou em parte, em sua área de atuação;
IV - dos usuários das águas de sua área de atuação;
V - das entidades civis de recursos hídricos com atuação comprovada na bacia.
Art. 47. São consideradas, para os efeitos desta Lei, organizações civis de recursos hídricos:
I - consórcios e associações intermunicipais de bacias hidrográficas;
II - associações regionais, locais ou setoriais de usuários de recursos hídricos;
III - organizações técnicas e de ensino e pesquisa com interesse na área de recursos hídricos;
IV - organizações não-governamentais com objetivos de defesa de interesses difusos e coletivos da sociedade;
V - outras organizações reconhecidas pelo Conselho Nacional ou pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos.

 

CONCLUSÃO
De nada adianta existir um CBH, caso tal foro não seja, de fato e ao cabo, apropriado pela população; pois como foi visto, uma das suas principais atribuições é a elaboração do Plano de Recursos Hídricos da Bacia, consistindo esse em uma diretriz para os usos múltiplos da água. Mas no embate advindo dos múltiplos interesses, pode ser entendido, baseado na crise hídrica que vivemos, que a sociedade civil não está tendo um protagonismo efetivo nessas decisões.

 

(Leia a parte 2 desta série clicando aqui)

 
 
REFERÊNCIAS
AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS (ANA). Cadernos de capacitação em recursos hídricos volume 1 - O Comitê de Bacia Hidrográfica: O que é e o que faz? Brasília, DF: SAG, 2011. Disponível em: <http://arquivos.ana.gov.br/institucional/sge/CEDOC/Catalogo/2012/CadernosDeCapacitacao1.pdf>. Acesso em: 26 set. 2015.

BRASIL. Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997. Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, regulamenta o inciso XIX do art. 21 da Constituição Federal, e altera o art. 1º da Lei nº 8.001, de 13 de março de 1990, que modificou a Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 9, jan. [1997]. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9433.htm>. Acesso em: 18 ago. 2022.